Wednesday 31 October 2007

Buenos Aires maldita

Passadas as eleições, que tiveram o resultado previsto - com Cristina Kirchner eleita no primeiro turno - lá fui eu fazer uma matéria sobre os principais desafios do novo governo. A intenção era incluir a falta de segurança, apontada como a principal preocupação dos eleitores em uma pequisa realizada no final da campanha eleitoral.
Eis que acabei sendo vítima dela durante a realização da matéria, que nunca ficou pronta. Tinha acabado de voltar de uma entrevista com um analista e como tinha esquecido minha carteira no hotel, voltei para apanhá-la. Em seguida atravessei a rua e resolvi gravar a passagem (aquele trecho em que o repórter aparece no vídeo) em frente a uma estação de metrô - o Subte, como é chamado aqui -, com a estátua de Simon Bolívar ao fundo. Depois de montar o tripé, uma mulher me chamou a atenção que alguém tinha espirrado algo na minha calça e reparei que ela estava toda suja, com um líquido branco, na parte de trás das pernas. A mulher se mostrou solidária e me deu um lencinho de papel para limpar a calça e me ajudou a limpá-la. Mas ela insistiu, dizendo que continuava suja, mais para cima, na minha bunda. Comecei a achar a insistência dela meio chata, mas fiquei olhando para trás para conferir o que ela estava falando. Ao mesmo tempo, um outro senhor me chamou a atenção e apontou para uma janela do prédio, dizendo que ele achava que o líquido que me sujou tinha sido jogado lá de cima. Com os dois me atordoando, só ouço um senhor gritando: "Um garoto roubou sua mochila!!!", apontando para a escadaria da entrada do metrô. Eu olhei para baixo do tripé e a mochila realmente não estava mais lá. Gelei e sem acreditar no que estava acontecendo, desci as escadas correndo como uma louca, berrando: "Polícia, polícia, polícia!" Desci correndo até a plataforma e pedi para pararem o trem. Revistei vagão por vagão, olhei embaixo de todos os bancos e nada. Eu não estava acreditando no que estava acontecendo, fiquei desesperada, pensando na câmera caríssima (uma Sony HDV Z1 nova) e no cristal do meu irmão que eu carregava na minha carteira.
A polícia apareceu depois de cerca de 10 minutos e quando contei a minha história, o policial disse que a única coisa que poderia fazer era dar uma olhada no metrô para ver se achava o assaltante. Se eu não encontrei os desgraçados segundos depois do assalto, o cara achava mesmo que ia me acalmar dizendo que uma revista 10 minutos depois iria funcionar???
Eu estou me sentindo uma imbecil por ter caído no golpe desta gangue de canalhas. Trouxa de confiar que pessoas na rua podem ser gentis. Enganada, desiludida e muito triste com a maldade do ser humano. Lá se foram câmera, luz, baterias, microfones, dois celulares (um eu recebi emprestado), minha agenda, e, o pior (que meus chefes não leiam isso): minha carteira com vários amuletos de coração. O Julien me disse que está muito aliviado que nada aconteceu comigo e fisicamente não aconteceu mesmo. Concordo com ele. Mas psicologicamente ainda não me recuperei do sentimento de impotência, de revolta e de ficar remoendo as minhas ações naquele 1 minuto que provocou uma reviravolta no clima da minha viagem.
Neste momento estou no aeroporto, voltando mais cedo para Londres, porque meu trabalho acabou. A viagem para Buenos Aires, que estava sendo uma grande experiência boa para mim, ficou amarga. Não vejo a hora de ir embora. Pelo menos levo na mala mais de 100 alfajores e 1kg de dulce de leche para adoçar um pouco a minha volta. Quem sabe daqui a algum tempo eu coloque este 1 minuto de um lado da balança e do outro coloque o reencontro com meus pais - que viajaram para Buenos Aires para me ver! - as minhas primeiras experiências de entradas ao vivo na TV, a companhia dos meninos da Band, conhecer a Márcia Carmo - finalmente! - meus encontros com o Paul, o tango do Café Tortoni e o sushi mais do que divino do Sushi Club de Puerto Madero. E talvez eu acabe chegando à conclusão que a viagem valeu a pena. Mas, por enquanto, estou muito chateada para isso.
Bom, e fica meu conselho para quem viajar para a Argentina: não confie em ninguém no centro de Buenos Aires. Infelizmente, pessoas honestas e gentis por natureza não se encontra em qualquer lugar por aí.

Saturday 27 October 2007

Mi Buenos Aires querida



Cá estou eu em Buenos Aires para cobrir as eleições argentinas. Se profissionalmente para mim está sendo muito legal - depois entro nos detalhes - os argentinos parecem não se importar com a votação de amanhã. Me disseram que antigamente o país não conseguia falar de outra coisa a não ser de política na época da campanha eleitoral e mais uma vez, me senti chegando atrasada numa cobertura, com a vontade de ter trabalhado em outras épocas, consideradas mais democráticas, em que a discussão política gerava debates, reações calorosas dos cidadãos defendendo seus pontos de vista e manifestações de ativistas nas ruas.
Desta vez, a mulher do presidente resolveu se candidatar e muitos analistas acham que a intenção dos Kirchner é ir jogando a peteca da presidência de um para o outro nos próximos anos. Os partidos políticos praticamente desapareceram e a oposição se fragmentou, o que beneficiou a primeira-dama, Cristina Kirchner, que está disparada nas pesquisas e deve ser eleita presidenta - como ela gosta de enfatizar - já neste domingo. Muitas pessoas com quem conversei têm um discurso parecido com o de muitos brasileiros: "É um bando de corruptos", "Nenhum deles presta", "Tudo vai continuar igual". A maioria dos meus entrevistados não iria votar em Cristina, mas todos já se conformaram com sua vitória.



Bom, mas vamos ao meu microcosmo... Diferentemente de outras coberturas e viagens, onde tinha de fazer rádio, Internet, gravar, editar e dar pirueta sozinha, desta vez estou me sentindo chique. Primeiramente, porque a competente stringer da BBC Brasil aqui em Buenos Aires está cuidando - e muito bem - da parte da Internet. E estamos dividindo as tarefas do rádio. Sobrou o vídeo e ontem sobrevivi a mais um grande desafio, do qual, confesso, estava morrendo de medo.
A Band enviou duas pessoas para testar um equipamento de link - aquelas entradas ao vivo que os repórteres fazem durante os jornais. E quem ficaria na frente da câmera? Eu! Quando soube, ainda em Londres, já comecei a passar nervoso só de pensar. Sou uma pessoa tímida e tinha certeza de que ia me enrolar na hora, justamente porque meus nervos não colaboram comigo nessas horas.
Eis que no primeiro dia de link, quarta-feira, os problemas técnicos obrigaram o cancelamento da entrada. No segundo dia parecia que não tinha como eu escapar, porque tudo estava funcionando. Só que o dia ensolarado, de 29ºC se transformou num mundo de chuva forte, de 15ºC e o link foi cancelado novamente. O Julien brincou que até dança da chuva eu fiz para me livrar do link, hahahahaha!
Bom, mas ontem não teve jeito. A previsão era de tempo bom e o link estava tinindo. E lá fui eu para a frente da câmera, tremendo, com dor no peito de tanto nervoso. "7 minutos para sua entada"... "Cinco"... "Três e meio"... "Um"... Eis que sou chamada no ar e começo a falar. Um delay inesperadono retorno (ficamos ouvindo o jornal com um fone de ouvido, mas se costuma silenciar o retorno quando começamos a falar. Os repórteres mais experientes conseguem falar se ouvindo - com segundos de atraso - sem errar, mas obviamente não me incluo neste grupo) me fez tentar arrancar o fone logo no começo da entrada, mas em seguida ele silenciou e eu desatei a falar o boletim que tinha ensaiado trilhões de vezes antes. E deu certo!!!! Depois de 10 segundos no ar, senti a adrenalina correndo pelo meu corpo e no fim de 40 segundos, quando tudo terminou, tremia feito vara verde. Mas deu tudo certo!!! Ufa!!!! Só espero que não passe o mesmo nervoso antes de toda entrada que fizer daqui para a frente!

Monday 8 October 2007

De volta à terra firme

Estamos devendo um post há tempos, é verdade... E como as coisas mudaram nas últimas semanas! A maior novidade é que deixamos de boiar na nossa espaçosa casa-barco no ensolarado Cairo para nos encaixar num mini-apartamento na cinzenta Londres.
Pensamos em encerrar os trabalhos do nosso blog, já que a intenção era contar as curiosidades de uma região tão diferente como o Oriente Médio para amigos, parentes e mais alguns leitores que nos honraram com sua presença no nosso blog durante nossa jornada.
Porém, por enquanto, o fechamento do blog está adiado. Primeiramente, porque ainda existem coisas do Oriente que precisam ser contadas aqui. Só nestas semanas que desaparecemos subimos o Monte Sinai à noite - e vimos dezenas de estrelas cadentes e o sol nascer lá do topo - e fui para um campo de refugiados palestinos no meio do deserto na Jordânia. Além disso, temos de falar sobre os taxistas egípcios e sobre várias outras experiências que tivemos no Cairo, que não contamos de lá por causa da correria do trabalho.
Portanto, aguardem nos próximos posts uma mistura de impressões de Cairo e Londres. Aliás, a primeira grande diferença que, já no táxi, espremidos entre as nove malas que trouxemos de volta (a pergunta que não quer calar durante estas últimas duas semanas é: “Pra quê tanta roupa???...) é de como esta cidade é silenciosa se comparada ao Cairo. É impressionante!!! As pessoas ficam absolutamente empacadas num trânsito infernal (demoramos três horas para chegar do aeroporto até a casa do Rodrigo, um amigo que nos acolheu) e ninguém buzina! Todos esperam, com uma paciência impossível de se encontrar em qualquer pedacinho de alma egípcia! Tinha taxista no Cairo que buzinava a cada 5 segundos. E não é exagero! Eu ficava me perguntando por quê o cara enchia a mão na buzina toda hora se não havia carro na frente, nem pedestre atravessando a rua, nem carroça no caminho. Aí comecei a cronometrar o tempo máximo que o taxista agüentava ficar sem tocar na buzina. 5 segundos!
Na primeira noite aqui em Londres dormimos como pedras. Só pode ser graças ao silêncio. Foi impressionante não ouvir nenhuma buzina durante a noite, nenhuma felluca (os barquinhos com turistas que navegam pelo Nilo) com as musiquetas irritantemente chatas e altas no meio da madrugada. Foi mais do que impressionante. Foi calmante. Saímos do estado de constante alerta em que estávamos e relaxamos. Vou sentir falta de várias coisas do Cairo, mas foi bom voltar para um lugar que já aprendemos a chamar de casa...



Espero que, em breve, esta seja a nossa sala. Continua com cara de armazém, mas já está melhor do que o que vocês estão vendo aqui. Fotos do resto do apê, só quando conseguirmos acabar o quebra-cabeça de encaixar o mundo de tralhas que nós temos no espaço disponível!