Monday 20 April 2009

Mila Balela II



Como prometido, fotos de momentos mais felizes da Mila!





Aqui, a midwife está pesando nossa pequena. Durante os primeiros dez dias de vida do bebê, as midwifes vêm nos visitar várias vezes em casa para ver se está tudo bem com o bebê e a mãe e tirar dúvidas. Na segunda pesagem da Mila, a midwife tinha acabado de sacar um paninho limpinho para pesá-la e ela resolver fazer xixi, molhando todo o pano da midwife!

Sunday 19 April 2009

Falhas do sistema

Como prometido, vamos ao segundo capítulo da nossa saga com a Mila no sistema de saúde público britânico... Para começar, um dia após a operação, peguei uma infecção - o que pelo menos me rendeu um quarto na segunda noite, onde o Julien também podia dormir com a gente.

No sistema público daqui a praxe é as mães ficarem todas em uma área comum, com camas separadas por cortinas, onde os acompanhantes não podem passar a noite. O legal do esquema daqui é que o bebê fica com a mãe 24 horas por dia e não é separado dela em nenhum momento desde o nascimento. O duro é que é a mãe de primeira viagem (no meu caso, pelo menos) que desde a primeira noite tem de trocar as fraldas do nenê e fazê-lo parar de chorar de alguma forma (no meu caso, a Mila só parou de chorar quando dormiu na cama comigo...). Durante a noite inteira você conta com a ajuda das midwifes, que te dão dicas para amamentar e colocar o bebê para dormir (no meu caso, nenhuma delas funcionou, já que a Mila teve de ser alimentada com meu leite com uma seringa porque tinha "preguiça" de mamar e não parava no berço de jeito nenhum).

Bom, mas na segunda noite o Julien estava dividindo as tarefas comigo (com exceção da alimentação, é claro), já que fomos colocadas em um quarto separado para não infectar as outras mães e seus bebês. O lado ruim é que, além do estado deplorável pós-operatório, ainda tive de tomar soro na veia para repôr tudo que saía por baixo...

Bom, detalhes escatológicos à parte, na terça-feira, dia 24.03, finalmente fomos liberadas para ir para a casa! Após um início um tanto quanto conturbado, estávamos felizes de finalmente chegar no nosso lar e começar a nossa nova vida com a Mila!

Eis que na quinta-feira ela fica extremamente letárgica, sem energia sequer para mamar, ao ponto de à tarde não abrir mais os olhos quando tentamos acordá-la. E lá fomos nós de volta para o hospital. Diagnosticaram desidratação e iniciaram uma série de exames (com uma agulhada horrenda na coluna da Mila e várias picadinhas no pé dela) para ver se ela estava com infecção. Enquanto isso, já enfiaram uma cânula na mini-veia da mão direita da Mila para encher o corpinho da coitada com antibióticos...

Comecei uma operação de guerra para conseguir amamentá-la apenas com o meu leite e assim evitar que ela ainda por cima precisasse ser entubada para ser alimentada - e pelo menos isso deu certo! Extraía o leite com uma bomba e uma midwife enfiava o líquido goela abaixo da Mila com um copinho. E tivemos de encarar mais uma noite sozinhas na área comum...

Eis que no dia seguinte o Julien foi conferir alguns resultados de exames da Mila (ela estava com um grau de infecção , um tal de CRP, de 9,7, quando o normal é 1) e por acaso viu os meus dados quando fui liberada do hospital. Eu estava com um grau de infecção de 80 quando o normal é 5!!! E nos liberaram!!! Sem sequer checar se talvez-por ventura-quem sabe, a Mila também tivesse algo!

Bom, pelo menos fomos isoladas em um quarto mais uma vez e passamos longos e agonizantes cinco dias no hospital, já que a Mila tinha de tomar antibiótico pelo menos durante este período.

Durante estes cinco dias nos deparamos com várias falhas do sistema. A limpeza do quarto era extremamente superficial e no entra-e-sai de midwifes e médicos durante o dia todo cada um falava uma coisa diferente. Além disso, como se não bastassem as inúmeras picadinhas que a Mila levava nos pés para tirar sangue, picaram a coitada até desnecessariamente, pois o laboratório perdeu o sangue dela. Cerca de duas horas depois de repetirem a picada para retirar uma nova amostra de sangue, um midwife resolve tirar outra amostra falando que "a outra não deu certo". Explicamos para ele que a segunda amostra já tinha sido retirada e ele não deu a mínima importância, dizendo que "de qualquer jeito precisamos tirar mais". Cerca de uma hora depois do evento, o cara abre a porta do nosso quarto dizendo que acabou de cair no sistema dele que realmente a segunda amostra já tinha sido retirada e que por isso ele não iria enviar a que ele retirou ao laboratório. Preciso dizer que a vontade era de esmurrar o infeliz???

Bom, cinco dias depois de antibióticos, pessoas incompetentes e paredes brancas de hospital (vale ressaltar que pelo menos a comida era bem decente), voltamos a ver a luz do dia e fomos para a casa! Ufa!!!

Estamos na segunda tentativa de começar a nossa vida nova com a Mila em casa. E não tem sido fácil. Ela está sofrendo de gases porque é tão educada que na maioria das vezes não consegue arrotar depois de comer e ainda por cima pegou um resfriado e está com o nariz e a garganta cheios de catarro, coitadinha. Probleminhas que acontecem. Mas que resolveram se acumular todos no primeiro mês de vida da Mila...

Apesar deste começo complicado, das poucas horas de sono e dos momentos extremos em que cheguei a chorar e me perguntar se um futuro mais calmo está próximo, ter a Mila perto da gente é o melhor presente que já ganhamos!

E descobri o que é amor de mãe. Olho para minha mãe e, apesar de sempre ter sabido que ela me ama muito, agora sinto o que ela sente por mim. É um amor muito, muito, muito grande e generoso, que não pede nada em troca e que faz a pessoa sofrer muito quando vê o objeto de seu amor sofrendo nem que seja um pinguinho de nada. Obrigada, mãe, por ter cuidado e ainda cuidar tão bem de mim. Eu espero conseguir fazer o mesmo pela Mila.



Aí a Mila com uma meinha da mão para proteger a cânula por onde ela recebeu os antibióticos e com os pés todos furadinhos... Prometo que daqui para a frente só vai ter foto dela em situações melhores!

Monday 6 April 2009

Quem decide é o bebê



Sei que estou devendo este post há mais de duas semanas. Duas semanas extremamente intensas emocionalmente e desgastantes fisicamente (tanto que estou tentando escrever este post há três dias e nunca consigo conclui-lo!). Bom, vamos lá à minha experiência de parto!

Na sexta-feira, dia 20 de março, um amigo nosso, o André, que é fotógrafo, veio aqui em casa dar um presentão para nós: fotos profissas dos pais grávidos (uma vocês conferem aqui). Fiquei um tanto quanto nervosa antes do "ensaio fotográfico", já que sou meio tímida e não me acho lá muito fotogênica... Mas profissional como o André é, até que ficamos bem à vontade na hora H.

De qualquer forma, durante a semana toda, senti que algo não estava muito certo, estava sentindo uma tristeza e um desânimo inexplicáveis, sentimentos opostos aos que eu tive durante toda minha gravidez - que curti à beça!

Bom, terminadas as fotos, senti um corrimento um pouco acima do normal e meu coração acelerou. Será que é a bolsa rompendo? Mas será que sai assim pouquinho? O Julien achou bobagem e falou que não era possível.

Assim que o André foi embora, resolvemos ir ao supermercado para comprar mantimentos para a chegada da minha mãe no domingo. Ela queria porque queria chegar antes do nascimento para ainda me ver barriguda e como eu tinha certeza que a Mila iria atrasar, achei que vir 10 dias antes da data prevista já estava de bom tamanho.

Ao pisar no supermercado senti muuuita água descendo pelas minhas pernas.
"Julien, agora tenho certeza, tô encharcada. Vamos pra casa porque rompeu a bolsa!" Nós dois, despreparados para um eventual nascimento antes da data, estávamos sem um número de telefone do hospital. Respirei fundo e expliquei ao Julien que ainda tínhamos muuuito tempo, já que não estava sentindo nenhuma contração ainda e o primeiro estágio do trabalho de parto, que pode durar horas a fio, normalmente se passa em casa. Pegamos o ônibus, fomos para a casa e ligamos para o hospital, que pediu para irmos até lá para checarem o líquido da bolsa.

Crentes que iríamos voltar para a casa (aqui te mandam de volta para a casa até suas contrações ficarem insuportáveis e você estar com certa dilatação) saímos sem mala pronta (pois é, eu não tinha arrumado minha mala nem da Mila ainda, apesar da insistência do Julien...) e fomos conferir em que estágio estava o processo.

Fomos direto para o centro de partos, onde eu planejava ter a Mila dentro da água, mas assim que a midwife analisou o conteúdo da minha bolsa, meus planos começaram a desmanchar no ar. A Mila tinha feito mecônio (o primeiro cocô do bebê) dentro da placenta (ao invés de fora, depois de nascer) e portanto precisava ser monitorada constantemente, o que não poderia ser feito no centro de partos e sim apenas na maternidade tradicional. Fiquei arrasada e extremamente decepcionada.

Fomos então transferidos para o andar de baixo, para uma sala típica de hospital, cheia de máquinas, com uma cama de hospital, tudo o que eu não queria. Tentei esquecer do que tinha dado errado e seguir em frente para pelo menos ter um parto em terra sem intervenções médicas.

Para isso estendi minha esteira de ioga no chão e usei todas as posições que aprendi na minha aula de ioga para grávidas para aumentar minhas contrações. Ajudei com aromaterapia e remédios homeopáticos, pois sabia que por causa do mecônio eu não tinha todo o tempo do mundo para ela nascer (segundo as midwifes, existe o risco de o bebê estressar na barriga e acabar aspirando mecônio, o que pode até ser fatal). Enquanto a maioria das grávidas quer sentir menos dor na hora do parto eu torcia para ter contrações mais e mais doloridas, porque isso seria um sinal de que a Mila estaria chegando logo!

Depois de umas 8 horas fui examinada: 2 cm de dilatação (dos 10 cm necessários para o bebê sair!)... Não tinha mais jeito. Uma médica recomendou que acelerássemos o processo com uma indução, ou seja, a introdução de uma imitação da oxitocina, o hormônio que estimula as contrações. Apesar de não ter sonhado com isso, aceitei a intervenção. Pelo menos, ainda havia grandes chances de um parto normal...

Mas aí veio o grande choque. Depois de uma das médicas examinar minha barriga, ela ficou encafifada e resolveu pegar uma máquina de ultrassom para checar a posição da Mila na barriga. Lá estava minha buni na tela, sem eu conseguir identificar qual imagem correspondia a qual parte do corpo. A médica parou com o ultrassom logo abaixo do meu peito esquerdo e ficou olhando para a imagem na tela.

Eu perguntei: "Que parte é essa?"
Silêncio desesperador de alguns segundos que pareciam horas para nós dois.
"A cabeça."

Não. Não, não, não!!!! A Mila estava invertida, com a bunda para baixo!!! Não acreditei e pedi à médica para ela estar brincando. Chorei muito, incrédula, já que em todos os exames manuais durante a gravidez os médicos e as midwifes me disseram que a Mila estava na melhor posição para nascer (com a cabeça para baixo e a coluna do lado esquerdo da barriga). Naquele momento o fantasma da cesárea começou a me aterrorizar.

Após alguns minutos, enquanto tentava digerir o grande choque, entra outra médica e nos explica nossas possibilidades: a mais segura, uma cesárea. A mais arriscada, um parto vaginal, com a ressalva de que é minha primeira gravidez e portanto meu canal é mais estreito e o bebê aparentemente grande, o que poderia fazer com que ela fique presa no meio do caminho e sofresse asfixia ou aspirasse mecônio.

Saíram da sala e nos deram um tempo para pensar sobre as possibilidades, embora já estivéssemos praticamente convencidos de que a melhor saída seria mesmo uma cesárea. Por desencargo quis consultar um livro que me acompanhou durante toda a gravidez (ótimo, aliás: Birth and Beyond, do Yehudi Gordon), que no meu caso também aconselhava uma cesárea. Batemos o martelo e começaram os preparativos para a operação. Nem preciso falar que fiquei arrasada...

O mais impressionante foi que as contrações, que até então estavam ficando cada vez mais sofridas, passaram a ficar insuportáveis porque perderam completamente o sentido para mim naquele momento. Até então, as contrações eram sinal de que a Mila estava chegando cada vez mais perto de nós, mas a partir do momento em que eu saquei que ela não poderia mais sair pelas vias normais, as contrações perderam o sentido e passei a sentir muita, muita dor até me enfiarem uma baita agulha na espinha e anestesiarem todo meu corpo do peito para baixo. Foram mais de 10 horas de contrações para 4 cm de dilatação.

A operação foi horrível. Me deu uma tremedeira incontrolável e, apesar de você teoricamente não sentir dor (senti certa dor no meu peito quando já estavam no processo de costura), você sente os médicos repuxando tudo na região abdominal, parece que estão sovando massa de pão, sei lá. Um horror. O Julien ficou sentado do meu lado, na altura da minha cabeça, e não vimos nada porque foi levantada uma cortina logo abaixo do meu peito (e o Julien, apesar de poder ver a operação, preferiu não olhar).

Quando finalmente chegou o momento de retirada da Mila, a cortina foi abaixada e me senti no paraíso. Vi aquele serzinho pequenino, loirinho, com os olhos arregalados, olhando para mim e imediatamente comecei a chorar de emoção, alívio, felicidade, um mar de sentimentos tão, tão bons... Foi inacreditável, incrível, um verdadeiro milagre, ver que depois de nove meses e um parto sofrido saiu um ser tão incrível lá de dentro.

A Mila foi levada para uma mesa a alguns metros da mesa de operação, acompanhada do Julien, que cortou o resto do cordão umbilical dela. Ali ela foi enxugada, pesada e examinada. Depois de alguns minutos, o Julien veio com ela para a mesa de operações e ela foi colocada logo abaixo do meu colo, onde inundei a nossa filhota com lágrimas.

A experiência foi bem diferente do que eu sonhava. Até hoje ainda choro quando penso a respeito e ainda estou tentando lidar com tudo o que aconteceu. Às vezes me culpo, achando que estressei a Mila a ponto de fazer ela soltar o mecônio na placenta (talvez as fotos, talvez a ioga, não sei, não sei...). Outras vezes fico revoltada com o sistema de saúde daqui, que só prevê dois ultrassons durante toda a gravidez, sendo o último às 20 semanas. Se eu soubesse que os médicos poderiam errar tão feio a posição do bebê no útero, teria pago um ultrassom particular por volta das 35 semanas, quando eu ainda poderia tentar mudar a posição da Mila para ter um parto normal.

Mas tento colocar na minha cabeça que tive o parto perfeito. Perfeito porque o resultado foi perfeito. A Mila saiu, saudável e linda. E durante toda a gravidez eu sempre tentei colocar na minha cabeça que quem decide como vai chegar ao mundo é o bebê e não à mãe e por mais que eu tivesse um plano de parto, a Mila sairia como ela bem entendesse. E se o desejo dela foi ficar sentadinha durante toda a gravidez e enganar os médicos, o que eu posso fazer, não é?!

Bom, aguardem o próximo post, pois tenho mais queixas do sistema de saúde daqui. Outro parto começou dois dias depois de termos sido liberadas do hospital...