Thursday 13 September 2007

Menos poluição

E começou o Ramadã! Ficamos altamente impressionados – o Julien, ex-fumante beirou o inconformismo – de não ver um único ser nesta cidade com um cigarro na boca durante o dia! Nada de fumaça na cara dentro dos táxis, nada de egípcios fumando shishas nos cafés, nenhuma pista de uma brasa soltando nicotina e intoxicando os pulmões dos fumantes – e dos não-fumantes! A poluição sonora, embora não tenha sumido (feito impossível aqui no Cairo), diminuiu bastante devido à quantidade reduzida de carros nas ruas, especialmente após a quebra do jejum (que hoje aconteceu às 18h05, segundo o nosso porteiro). Aliás, o Saied, nosso porteiro, diz ter aproveitado a onda do Ramadã para parar de fumar de vez! Como ele mesmo disse: Insha allah! (Deus queira!)
Quanto ao meu dia de Ramadã, foi um tremendo fiasco e comprovei mais uma vez que não nasci para ser muçulmana... Fui dormir com aquela neura de não poder beber água de manhã (costumo virar um copo de água, que já fica me esperando na mesinha de cabeceira, assim que acordo), e tive pesadelos durante a noite, o que me fez acordar várias vezes para tomar o copo de gole em gole antes do pôr-do-sol. Aí acordei umas 8h com aquele gosto de travesseiro na boca e não podia mais beber água. Pois bem, ignorei também meu sagrado café-da-manhã e lá fui eu para um looongo dia de trabalho para preparar uma matéria de vídeo sobre o Ramadã. Como sou muito mão-de-vaca e os preços todos aumentaram por causa do Ramadã, fiz vários deslocamentos a pé em vez de pegar um táxi e aquele solzão batendo na minha cabeça, a mochila pesadérrima com o equipamento de vídeo, o tripé e a câmera a tiracolo me fizeram clamar por água. Como é altamente indelicado tomar qualquer líquido na frente de pessoas que realmente não podem tomar – além de ser bem complicado achar algo para beber na rua este mês – esperei até chegar em casa e, pouco mais de seis horas depois do começo do meu jejum, lá estava eu virando um garrafão de água da geladeira de casa goela abaixo...
Bom, aprendi que o sacrifício que os muçulmanos fazem neste mês não é pequeno, apesar de, pelo menos os egípcios, terem lá as suas “gambiarras” para facilitar o jejum.
Para quem não sabe, o Ramadã é celebrado no nono mês do calendário lunar, período em que se acredita que o Alcorão começou a ser revelado ao profeta Maomé. Durante 29 ou 30 dias (depende do ano), os muçulmanos têm de ficar sem comer, beber, fumar, fazer sexo e ter pensamentos impuros (ha, quero ver conferirem este último!) do nascer ao pôr-do-sol.
Depois de o sol sumir atrás do horizonte, é hora da comilança! Muitas mesas são colocadas nas ruas, calçadas e outros locais públicos, onde os pobres recebem doações de comida dos mais afortunados e generosos. Ironicamente, aqui na casa-barco, quem nos convidou para comer foi justamente a família humilde do nosso porteiro. Bunis, olhem eles aí...



Bom, mas voltemos às gambiarras. O desjejum é o começo do dia dos egípcios, que, se já costumam ter a vida noturna mais agitada que eu já vi, viram perfeitos vampiros durante o Ramadã. Depois do desjejum vêm as séries e novelas especialmente produzidas para este mês (imaginem, que maravilha, novela sem embromação?). Os filmes “inéditos” anunciados nas TVs não começam antes das 2h da madrugada. Aliás, este é o horário que todos costumam comer pela segunda vez, muitos em restaurantes. Depois da noitada, todos vão dormir para acordar lá pelas 11h ou meio-dia do dia seguinte. Aliás, as jornadas de trabalho e das escolas são reduzidas durante este mês.
Agora, façam as contas: acordar ao meio-dia e desjejuar às 18h é exatamente o tempo em que eu fiquei de jejum hoje! Então, pelo menos uma muçulmana egípcia eu poderia ser! Obviamente se no pacote não viessem tooodas as problemáticas de não haver igualdade de direitos entre os sexos nem a obrigação de se cobrir dos pés à cabeça num verão de 40ºC, entre outros detalhes...



Aqui um exemplo da comilança pós-pôr-do-sol, em Zamalek

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