Monday 26 January 2009



Conhecida por sua imparcialidade e extrema (e às vezes irritante) cautela, a BBC se envolveu em uma grande polêmica neste fim-de-semana. O argumento do diretor-geral, Mark Thompson, é justamente manter a imparcialidade em um dos assuntos mais delicados da cobertura jornalística internacional: o conflito entre palestinos e israelenses.

A BBC obriga todos os funcionários a realizar cursos para entender o conflito e usar a terminologia correta (na visão da BBC) para abordar o tema. Por exemplo, a barreira construída por Israel na Cisjordânia não deve ser chamada de "cerca de segurança", por ser um termo preferido pelo governo israelense, nem de "muro do apartheid", ppreferido pelos palestinos. Tanto cuidado tem uma explicação: a BBC recebe uma enxurrada de reclamações tanto de israelenses como de palestinos de que está beneficiando o lado oposto.

Mas a tão aclamada "imparcialidade" está sendo utilizada agora para justificar uma das decisões que vem gerando críticas de quase todo o resto da imprensa britânica, de grande parte da população e até de jornalistas que trabalham na própria BBC.

A organização beneficente Disasters Emergency Committee (DEC) resolveu veicular na imprensa um apelo conjunto de vários grupos humanitários britânicos para levantar fundos para as milhares de vítimas dos ataques de Israel na Faixa de Gaza. Como todo mundo que acompanha o noticiário internacional sabe, mais de 1,3 mil palestinos foram mortos, entre eles pelo menos 400 crianças, e outros milhares foram feridos, superlotando hospitais. A destruição deixou a população sem casa, energia, comida e água.

Na sexta-feira, várias emissoras se recusaram a transmitir o apelo, pelo mesmo motivo alegado pela BBC: não dar a impressão de que está havendo favorecimento para o lado palestino. Porém, no sábado o governo britânico pediu para todas as emissoras reconsiderarem a decisão, argumentando que este é um problema humanitário e que nenhuma agência quer envolver política nesta história. Quer apenas ajudar os necessitados. Resultado: todas resolveram transmitir o apelo, com exceção da BBC...

Os jornais de domingo condenaram a decisão da emissora, inclusive com vários artigos assinados por jornalistas que trabalhavam ou ainda trabalham para a corporação. E assim como a maioria dos funcionários, estou do lado deles. Tenho certeza de que se a tragédia ocorresse na África ou em qualquer outro lugar a BBC transmitiria o apelo. Por isso, muitos a acusam de estar sendo parcial (favorecendo o lado israelense) justamente ao não veiculá-lo.

Porém, ao mesmo tempo em que estou envergonhada de trabalhar em um lugar que teve uma atitude tão absurda, sinto orgulho de algo que nunca aconteceria no Brasil: a emissora que mais discute a polêmica, ouvindo várias pessoas de agências humanitárias condenando a atitude, é justamente a BBC. Já na manhã de sábado, na BBC News, um convidado no estúdio se dizia inconformado com a decisão, fazendo inúmeras críticas à BBC. Vários outros apareceram durante o dia todo, ao lado da entrevista de Mark Thompson defendendo a medida. Hoje a emissora está veiculando inúmeros e-mails de telespectadores fazendo duras e revoltadas críticas à atitude da BBC.

Hoje também a Sky News, considerada uma das emissoras mais parciais e não-confiáveis da Grã-Bretanha, resolveu seguir os passos da BBC. Ficou ainda mais feio para a gigante britânica que prega a imparcialidade...

2 comments:

  1. Mamis, se até o que te dá orgulho na profissão também te envergonha, pode ser um sinal... pra educar direitinho a nossa Mila e não deixá-la passar perto de uma redação. Please!

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  2. hahahaha! o comentário do mr. neck é ótimo. subscrevo, inclusive! ;)

    agora, você imagina a globo fazendo isso aqui?

    beijo.

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